Sim, as mulheres devem ter controle absoluto sobre seus próprios corpos. Segue logicamente que elas podem escolher qualquer procedimento médico que quiserem? A resposta não é tão simples. Se uma mulher vai a um obstetra exigindo uma circuncisão feminina em sua filha, deveria o médico fazê-la? A maioria das mulheres americana diria não e a maioria dos obstetras, incluindo aqueles promovendo os direitos das mulheres escolherem a cesárea, muito provavelmente também diriam não.
Em um artigo recente em uma revista científica obstétrica, o Presidente de American Collegge of Obstetricians and Gynecologists incita os médicos a encorajarem as mulheres a escolher uma cesárea e citam o Brasil como um exemplo maravilhoso de honra à escolha das mulheres pela cesárea. Tendo passado um mês lá recentemente, eu vi com meus próprios olhos como o Brasil é um exemplo trágico do que acontece quando os médicos se afastam das indicações médicas para a cirurgia – hospitais com 100% de cesáreas, estados inteiros com 50% de cesáreas e nestas áreas, com essas taxas extremas de cesáreas, a taxa de mulheres morrendo próximo ao parto está, não surpreendentemente, subindo. E estudos mostram que as mulheres no Brasil querem cesárea porque na sua cultura machista temem perder seus homens se elas não têm o que os médicos chamam de uma "vagina de lua-de-mel". É isso que queremos para os Estados Unidos?
Uma mulher surda não pode fazer uma escolha entre Mozart e Beethoven. "Escolha" sem informação completa não é escolha. A questão ética chave não é o direito de escolher ou exigir um procedimento cirúrgico de grande porte para o qual não há indicação médica, mas o direito de receber e discutir informações completas e não tendenciosas, anteriormente a qualquer procedimento médico ou cirúrgico. Isto requer revelação obrigatória de todos os riscos conhecidos de uma cesárea eletiva dada às mulheres na entrada do hospital (não quando ela está no auge do trabalho de parto ou sendo preparada para a cirurgia), assim como dando a elas seus direitos de Miranda*. Isto é muito diferente do que acontece hoje: na entrada do hospital é dada a mulher uma folha de papel para que ela assine, que não é para sua educação ou benefício, mas para proteger o médico e o hospital de ação judicial, essencialmente dando a eles carta branca para fazerem com ela o que quiserem.
A informação dada à mulher para decidir que tipo de parto ela terá, tem que vir de uma fonte neutra e não tendenciosa como Federal Centers for Disease Control (Centros Federais de Controle de Doenças) ou outros cientistas. Qualquer informação provinda de organizações profissionais como o American College of Obstetricians and Gynecologists será inevitavelmente tendenciosa, pois o objetivo número um de qualquer organização profissional é proteger o interesse de seus membros. Como resultado, a informação disponível para os obstetras pode ser tendenciosa, gerada por firmas comerciais interessadas em lucros ou por organizações profissionais interessadas em promover dados mais favoráveis para os médicos sobre procedimentos. O resultado: muitos obstetras mal informados e não qualificados para fornecer informações completas e não tendenciosas para as mulheres.
Eticamente falando, os médicos, assim como as mulheres, têm direitos a respeito do cuidado médico. É bem estabelecido nos EUA que nenhum médico é obrigado a fazer algo contra sua crença religiosa. Pelas mesmas razões, o médico não pode usar "ela quis" como desculpa para fazer o que ele quer fazer de qualquer forma. A primeira obrigação de um clínico é com o bem estar de seu paciente e se uma mulher pede por uma cesárea para qual o médico não consegue encontrar indicação e que, pelo melhor do seu conhecimento, traz riscos para a mulher e seu bebê que compensam qualquer benefício possível, o médico tem o direito, talvez até o dever, de recusar-se a fazer a cesárea. Ninguém está apontando uma arma para a cabeça dele.
É por isso que a organização que conglomera todas as organizações obstétricas de nível nacional (incluindo o American College of Obstetricians and Gynecologists) emitiu uma declaração em 1999: "Devido a evidências fortes de que o benefício em cadeia não existe, realizar uma cesárea não é eticamente justificável".
Dr. Marsden Wagner
Médico Pediatra e Neonatologista, Dinamarca
PS: o Autor do texto é Diretor de Saúde da Criança e da Mulher, da Organização Mundial de Saúde
Em um artigo recente em uma revista científica obstétrica, o Presidente de American Collegge of Obstetricians and Gynecologists incita os médicos a encorajarem as mulheres a escolher uma cesárea e citam o Brasil como um exemplo maravilhoso de honra à escolha das mulheres pela cesárea. Tendo passado um mês lá recentemente, eu vi com meus próprios olhos como o Brasil é um exemplo trágico do que acontece quando os médicos se afastam das indicações médicas para a cirurgia – hospitais com 100% de cesáreas, estados inteiros com 50% de cesáreas e nestas áreas, com essas taxas extremas de cesáreas, a taxa de mulheres morrendo próximo ao parto está, não surpreendentemente, subindo. E estudos mostram que as mulheres no Brasil querem cesárea porque na sua cultura machista temem perder seus homens se elas não têm o que os médicos chamam de uma "vagina de lua-de-mel". É isso que queremos para os Estados Unidos?
Uma mulher surda não pode fazer uma escolha entre Mozart e Beethoven. "Escolha" sem informação completa não é escolha. A questão ética chave não é o direito de escolher ou exigir um procedimento cirúrgico de grande porte para o qual não há indicação médica, mas o direito de receber e discutir informações completas e não tendenciosas, anteriormente a qualquer procedimento médico ou cirúrgico. Isto requer revelação obrigatória de todos os riscos conhecidos de uma cesárea eletiva dada às mulheres na entrada do hospital (não quando ela está no auge do trabalho de parto ou sendo preparada para a cirurgia), assim como dando a elas seus direitos de Miranda*. Isto é muito diferente do que acontece hoje: na entrada do hospital é dada a mulher uma folha de papel para que ela assine, que não é para sua educação ou benefício, mas para proteger o médico e o hospital de ação judicial, essencialmente dando a eles carta branca para fazerem com ela o que quiserem.
A informação dada à mulher para decidir que tipo de parto ela terá, tem que vir de uma fonte neutra e não tendenciosa como Federal Centers for Disease Control (Centros Federais de Controle de Doenças) ou outros cientistas. Qualquer informação provinda de organizações profissionais como o American College of Obstetricians and Gynecologists será inevitavelmente tendenciosa, pois o objetivo número um de qualquer organização profissional é proteger o interesse de seus membros. Como resultado, a informação disponível para os obstetras pode ser tendenciosa, gerada por firmas comerciais interessadas em lucros ou por organizações profissionais interessadas em promover dados mais favoráveis para os médicos sobre procedimentos. O resultado: muitos obstetras mal informados e não qualificados para fornecer informações completas e não tendenciosas para as mulheres.
Eticamente falando, os médicos, assim como as mulheres, têm direitos a respeito do cuidado médico. É bem estabelecido nos EUA que nenhum médico é obrigado a fazer algo contra sua crença religiosa. Pelas mesmas razões, o médico não pode usar "ela quis" como desculpa para fazer o que ele quer fazer de qualquer forma. A primeira obrigação de um clínico é com o bem estar de seu paciente e se uma mulher pede por uma cesárea para qual o médico não consegue encontrar indicação e que, pelo melhor do seu conhecimento, traz riscos para a mulher e seu bebê que compensam qualquer benefício possível, o médico tem o direito, talvez até o dever, de recusar-se a fazer a cesárea. Ninguém está apontando uma arma para a cabeça dele.
É por isso que a organização que conglomera todas as organizações obstétricas de nível nacional (incluindo o American College of Obstetricians and Gynecologists) emitiu uma declaração em 1999: "Devido a evidências fortes de que o benefício em cadeia não existe, realizar uma cesárea não é eticamente justificável".
Dr. Marsden Wagner
Médico Pediatra e Neonatologista, Dinamarca
PS: o Autor do texto é Diretor de Saúde da Criança e da Mulher, da Organização Mundial de Saúde
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